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Você pode estimular os participantes a refletir coletivamente sobre as seguintes questões: é mais simples ou mais complexo escutar pessoas conhecidas? Por quê? O que dificulta este tipo de trabalho? O que facilita? Em relação a essas questões, muitas foram as opiniões das escutadoras do MUF. Você poderá relatar aos participantes o modo como as escutadoras se posicionaram, de forma que os diferentes pontos de vista sejam observados e analisados:
Cíntia (NIMESC): Isso é uma coisa importante, assim. Quem entrevistou gente que já conhecia a história da pessoa? Alguém mais entrevistou alguém que já conhecia? Porque isso pode ser uma facilidade e uma dificuldade, né? Você vai perguntar coisas pra pessoa que, a princípio, você já conhece, mas vai ter que escutar a versão que ela vai dar ali, naquele momento, pra uma câmera, pra essa história aí, pra outros espaços. Então, o que é que é fácil e o que é difícil de a gente entrevistar alguém que a gente já conhece, né? Por exemplo, entrevistar a própria irmã. Quem entrevistou a própria irmã? Ah, foi a Vânia, né? Você, o que você achou mais difícil dessa experiência?...
Vânia (escutadora): Não, é mais difícil, que dá vontade de falar logo: "Fala lá aquela história do...".
Débora (escutadora): A pessoa vai e para. Aí, tu fica agoniada. "Va’mbora, conta logo!". Como é que eu vou fazer ela contar? Aí, tu fica: “Eu sei disso, mas não consigo fazer ela falar.”.
Solange (NIMESC): Eu também acho que é mais difícil.
Danilo (NIMESC): É mais difícil.
Débora (escutadora): É igual... esse... eu vou entrevistar minha mãe em casa. Num... se tem... “Ah, manhê, fala aquela história que você falou pra mim?”.
Solange (NIMESC): Porque a gente já cria muita expectativa, né, em relação ao que vai ser dito.
Fabiana (escutadora): Será que fulano vai falar sobre aquele assunto? Será que vai falar sobre aquilo?
(...)
Débora (escutadora): Eu percebi que entrevistar as pessoas conhecidas é mais fácil...
Marta (escutadora): Eu gostei dela, da entrevista dela, da irmã dela, que, na entrevista, ela perguntava assim: “– E você, quer me perguntar alguma coisa? Quer perguntar?”. Dela eu gostei e não tinha intimidade com ela.
Débora (escutadora): Não, não é isso, não. É que, por ser a irmã dela, ela já conviveu com a irmã dela. Ela já sabe um pouco da história. Então, pra desenvolver as perguntas é mais fácil do que eu, que nunca vi a Dercy. Nem sabia que ela era avó do George. Convivi com o neto dela, então... Nunca vi ela no morro, gente!
Pensando ainda sobre o encontro para a escuta de memórias, pode surgir, em alguns casos, a situação de o narrador indagar o escutador ou convocá-lo a se posicionar sobre determinado assunto. Quem conta sua história pode ter uma opinião sobre um fato, mas pode também desejar ampliar o que pensa a respeito, a partir do olhar de mais alguém. Aí, a situação se inverte: o escutador é chamado a ocupar o lugar de narrador. Como agir nesse caso? O exercício de estar com o outro inclui, em alguns momentos, revezar nossas posições. Se o escutador for convidado a se posicionar e se sentir à vontade para falar, pode apresentar seu ponto de vista de forma breve. Num bate-papo está incluído esse movimento dinâmico de ir e vir entre mim e o outro. Mas o escutador pode, também, não querer falar de si, nem trazer seu ponto de vista. Assim, deverá encontrar um modo de apresentar isso ao seu interlocutor, de forma sincera e delicada, reforçando seu interesse, naquele momento, pela história do outro. 41
42 A arte de dar conselhos é tecida na substância viva da existência e tem um nome: sabedoria. A sabedoria é o lado épico da verdade.
(Walter Benjamin)
Outra questão que pode se colocar para o escutador diz respeito ao surgimento do desejo de falar. Ou seja, o próprio escutador pode se sentir tocado, sensibilizado, identificado com a história ouvida e, então, nasce o desejo de dar sua opinião ou ajudar de alguma maneira. Uma dúvida se impõe: o escutador pode ou não dar conselhos?42
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