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A prática da memória e a memória na prática

Atividade: Escutar com e sem roteiro: onde me sinto mais confortável?

Objetivos: Analisar junto aos participantes quais os efeitos do roteiro no trabalho do escutador.

Material: Não há necessidade de material específico.

Desenvolvimento:

  1. Os participantes são convidados a fazer duplas para realizar um bate-papo: uma pessoa da dupla deve desempenhar o papel de escutador e o outro contará a sua história de vida;
  2. Na primeira rodada, os escutadores construirão um roteiro de perguntas e o primeiro bate-papo será com este papel em mãos;
  3. Em seguida, você deve estimular todo o grupo a comentar a experiência;
  4. Deve se realizar uma segunda rodada sem roteiro, na qual novas duplas são formadas (os que estavam na posição de escutadores, na primeira rodada, agora devem permanecer nesse papel, para poderem comparar as duas experiências);
  5. Você pode estimular os participantes a discutir coletivamente as seguintes questões:
    • Em qual conversa me senti melhor: com ou sem roteiro? Por quê?
    • O roteiro ajuda ou atrapalha?
    • Se ajuda, quais são as perguntas que ele deve conter?
    • Se atrapalha, como posso agir?
    • O que foi mais interessante no trabalho sem roteiro?

3.2 Ser escutador: respeitar os limites, lidar com a emoção e os silêncios no encontro com o outro

Ao longo do bate-papo, alguns desafios podem atravessar a prática do escutador. Neste tópico, iremos refletir sobre alguns deles e pensar em estratégias para enfrentá-los. Durante a conversa, aquele que narra executa um trabalho de seleção das cenas que surgem na memória. No entanto, nem todas as cenas são apresentadas ao escutador. Essa decisão se dá por diversas razões, mas o importante é o escutador estar atento e perceber quando deve investir em determinado assunto e aprofundá-lo, e quando deve recuar e mudar a rota das questões, respeitando o limite do outro.

Em alguns momentos, o próprio interlocutor diz que não deseja falar sobre determinado tema, expondo seu desconforto. Noutras vezes, ele sinaliza de forma menos explícita: ora desconversando, ora mudando de assunto, ora titubeando ou calando-se. Por isso, é importante o escutador ter sensibilidade e ficar atento aos sinais, para saber quando eles representam certa indisponibilidade para falar.

O escutador demonstra que respeita e zela pela figura do interlocutor quando não insiste, quando oferece uma escuta generosa e livre de constrangimentos. Não podemos esquecer que o escutador é uma pessoa que colhe histórias e não alguém que arranca memórias ou segredos, invadindo a privacidade alheia. O escutador não é um investigador que busca desvendar fatos, descobrir aquilo que ficou escondido, arquitetando formas de persuadir aquele que fala. Impor que o outro diga coisas que não quer falar é também uma forma de violência. Escutar memórias é colher e acolher narrativas, é buscar, junto com quem conta, aquelas histórias que, por estarem maduras, podem ser compartilhadas.

Esse movimento de abrir-se para o outro, sem forçá-lo a percorrer um caminho que não deseja, se apoia na compreensão de que serão narradas as memórias que forem importantes para quem narra, naquele momento específico. Em outras palavras, ser escutador é compreender que, se uma pessoa tiver a necessidade de dizer alguma coisa, ela irá dizer, desde que haja quem ouça. A escutadora Débora também refletiu sobre essa questão:

Débora (escutadora): Ah, a questão de ela lembrar. O que ela lembrou foi o que era de mais importante pra poder dizer pra gente. O que ela não quis falar, eu acho que não era importante dizer. O que ela relatou é o que ela quer que passe pra frente. Ela não disse, ela não quer que passe, não quer que ninguém lembre.

Cíntia (NIMESC): Você tá falando que a pessoa seleciona aí o que quer ser lembrado.

Débora (escutadora): Tem coisas que ela acha que não quer ser lembrada. Não é importante, então não vou falar. Se é importante, eu quero que todo mundo saiba, todo mundo lembre. Futuramente, vai lembrar de tudo o que eu falei. Ah, lembra aquela senhora, lembra aquela senhora. O que ela não falou, não é importante. Assim, do ponto de vista dela. Poderia ser importante pra gente, mas, pra ela, não.

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